segunda-feira, 3 de março de 2014

Escola Vivencial


Lá estava eu com minhas reflexões e filosofias de derrotado, quando de repente, me vem uma obviedade na cabeça que explode meus conceitos de um modo inacreditável. Eu, mesmo com mais de 10 anos fora da escola, ainda estou na escola. E aí, eu repito em alto tom e voz uma frase clichê que parece soar como uma aberração da melosidade utópica:

"_A vida é uma escola"

Com um pouco de vergonha por ouvir da minha própria boca uma coisa que parecia tão abatida e digna de discurso ensaio para aparecer no Faustão, eu respirei fundo e meditei com um grau secundário aquelas palavras. E aí, antes de eu ser atacado pela possível obviedade dessa interpretação, eu peço a você, que caso tenha lido até aqui, que leia só mais um pouco para que eu possa me explicar como isso foi capaz de me surpreender num dia qualquer aleatório no ano.


Conceitos Acadêmicos


A gente bem sabe que a escola é onde as crianças entram para supostamente se formarem e aprenderem muitas coisas. Daí que desde aqueles conceitos platônicos, a escola esteve ligada ao aprendizado, e não é atoa que Platão e sua turma de pensadores se reuniam dentro de uma academia para pensar. Comecei a abrir um pouquinho o leque do conceito sobre "escola" para que fique totalmente claro onde eu quero chegar. Quero que você me entenda que eu realmente quero falar de uma escola cuja finalidade é aprender. E não estou falando se a educação no Brasil funciona, nem nada disso. Pegue apenas o conceito de que escola é um lugar onde se aprende. Tudo certo até aqui, né?

Agora pense em quantas escolas você pode estar nesse momento em que nem faz ideia... Vou tentar te dar um exemplo, já que a princípio essa frase parece muito subjetiva. No final do post eu vou repetir ela e espero que consiga fazer você me compreender. E vou começar primeiro falando da escola pela qual a gente já vai ter a mente formulando as cenas enquanto lê o texto. A imagem de uma bancada de crianças ou adolescentes (ou adultos, caso tenha pensado numa faculdade), dentro de uma sala de aula ouvindo o professor dar sua matéria. Querendo ou não, a forma de aprendizado mais comum que se conhece é essa, onde temos um orador e os ouvintes. E na posição de alunos, alguns aprenderão mais do que outros. Agora, vamos tentar nos imaginar como os alunos, para eu propor uma ideia aqui.

Um Aluno Eternal


E nesse contexto óbvio, apenas o fato de você frequentar a sala de aula todos os dias, farão com que sua vida se molde aquilo. Quando eu disse que a escola forma uma pessoa (eu disse isso?) eu quis dizer que a gente toma uma série de comportamentos e visões de mundo graças a tudo o que está ligado a escola. E vamos supor que duas vezes por semana você tem feito umas aulinhas de língua estrangeira. Apenas o fato de fazê-lo se mover aquelas aulas, te darão um aprendizado extra sobre outras pessoas que prefiram ficar em casa. Então, você seria aluno de uma escola rudimentar e de um curso extra-curricular. Muito bom para você, que vamos supor que seja muito aplicado nos dois lugares.

O fato de sua mente ter um desdobramento em afazeres diferentes, o obriga a ter a atenção e o aprendizado moldado em lugares diferentes. E aí, dentro do meu contexto inicial, poderíamos dizer que seriam duas escolas diferentes. Mas agora, eu queria aumentar a linha de exemplo, colocando aqui uma nova escola que muitas vezes não encaramos desse modo: um relacionamento amoroso. Imagine agora, que você conseguiu seu par romântico, mas que pelas vias sádicas do destino, só seja possível encontrar com essa pessoa aos sábados. Nos dias de hoje, diante de tanta tecnologia, eu acho que telefone, email e SMS dariam muito mais unificação a qualquer casal, mas vamos remontar a uma ideia um pouco mais antiga e supor que os encontros românticos só sejam possíveis uma vez por semana.

Uma vez por semana e você dedica seu tempo a conhecer melhor outra pessoa. Ou mesmo depois quando julgue já conhecer totalmente quem ama, ainda assim estará dedicando seu tempo a ela. E se todo tempo é uma soma de experiências, então querendo ou não, seu aprendizado continua. A princípio pode parecer que não, mas apenas reforçar algo que já se tem (como um sentimento) é potencializar um aprendizado. E como em qualquer escola, você não estuda várias vezes uma mesma matéria para se tornar melhor nela? Vamos supor que seja um namoro, então uma dedicação semanal, mesmo que curta, seria o suficiente para manter a periodicidade projetando aquele tipo específico de escola: uma escola chamada relacionamento.

E sem me prender muito a esse exemplo, imagine aquelas pessoas que uma vez por semana vão para a igreja no domingo rezar. Elas podem passam uma semana inteira sem se quer lembrarem que Deus existe, mas, o período de algumas horas dentro de uma igreja podem ajudá-las a manter seu lado da espiritualidade ativo. Ou seja, aquele mesmo conceito que comecei a explanar no início sobre as escolas em nossas vidas, podem ser muito bem aplicadas a praticamente tudo. E aqui, nesse último exemplo, apenas uma vez por semana te manteria um lado espiritual vivo, e quanto mais tempo dedicasse, maior seria o crescimento desse lado espiritual.

Como em qualquer escola, nossa dedicação é o fator que vai determinar o quanto estaremos abstraindo de aprendizado que aquilo proporciona. Seja abstrair o amor ou o prazer em um relacionamento, uma carga espiritual, um conhecimento técnico provindo de algum curso de língua estrangeira, e por aí a lista se estende. Até mesmo quando estamos em casa, às vezes no contato com nossa família, ou dedicando um tempo para lermos um livro. Tudo aquilo que fazemos em detrimento de abstração, pode gerar aprendizado. Mesmo em coisas que acreditamos já termos todo o aprendizado, ainda assim reforçamos o que sabemos. Por isso, muita coisa - ou quem sabe tudo - pode estar bem aplicado dentro do contexto sobre escola. Uma escola vivencial, onde somos eternos alunos.

Um Problema Escolar


Se eu consegui me expressar bem, então você entendeu que eu quis propor que tudo aquilo que fazemos com certo período em nossa vida pode ser considerado como uma escola. Mas, agora eu queria caminhar com um pé no chão, para expor um ponto muito negativo que recaí nessa história toda. O fato que se você dedica seu tempo para uma coisa, então você abstrai algo dessa coisa, e esse algo pode ser bom como pode ser ruim. O que quero dizer é que nem todo aprendizado é bom. E vamos para um fato bem real disso: A escola do trabalho.

Algumas pessoas tem sorte de estarem satisfeitas com o trabalho, e outras não. Não é nada incomum ver pessoas e pessoas rogando praga no trabalho ao condenar as segundas-feiras, ao propor o quão agradável é sair na sexta-feira a noite para poder curtir os finais de semana. Tudo isso parece esteriotipar o quanto trabalhar é uma coisa ruim no quesito do prazer. Até o sábio Seu Madruga já dizia isso: "Não há trabalho ruim, o ruim é ter que trabalhar".

Com isso em mente, temos que convir que se toda a nossa dedicação de tempo em pró de alguma coisa é estar em uma escola, então há certo sentido se a gente pensar que - pelo menos para muitos - o trabalho seria uma escola ruim. Quando a gente estuda na escola rudimentar lá do colegial, muitos a consideram ruim. Quando a gente está na escola de um relacionamento, alguns consideram boa - e alguns também consideram ruim. As vezes o mesmo acontece na escola da família, ou num curso profissionalizante e a lista, naturalmente é longa. Mas para não me perder em outro devaneio, quero voltar com meu exemplo do trabalho.

Imagine que você está infeliz com seu trabalho. Já pensou que, assim como todas as outras escolas de sua vida, você se dedica quase que em tempo integral para algo que pode ser uma má escola? Se todos nós abstraímos um aprendizado de cada escola da vida, já pensou que talvez, um trabalho ruim - ou um relacionamento ruim - possam estar fazendo com que você esteja abstraindo coisas totalmente ruins para si? Não é um simples acaso que muitas - e realmente muitas - causas de afastamento do trabalho sejam provenientes de depressão. Talvez, com uma reflexão assim, tirada num dia assim, possa fazer com que você pense melhor se realmente está "aprendendo" aquilo que quer para a vida.

Um Aluno Eternal num Problema Escolar


Mas, acho que poderia caber uma pergunta aqui: Como a gente poderia saber se nossas escolas estão realmente nos fazendo bem ou não? Às vezes, no decorrer do tempo, e na correria alucinada do dia-a-dia, nem paramos para nos perguntar se estamos abstraindo coisas boas agora que colheremos no futuro. Já estamos, com certeza, colhendo os frutos de coisas plantadas no passado, mas será que colheremos boas vinhas de frutos no futuro? Não quero fugir muito do contexto real para ir ao lado metafórico, mas queria realmente que esse texto valesse uma reflexãozinha. Queria que pensasse, aí por um instante, nessa coisa toda de ser um eterno aluno na escola da vida, por mais piegas que essa frase possa soar.

E acho que posso ajudar a deixar mais uma coisinha aqui no meio de tantas palavras: uma sugestão de como identificar uma escola ruim e como não pedir a matrícula dela. Para identificar eu acho que não deve ser assim tão difícil: certamente a gente pode dedicar um tempinho reservado à nós mesmos para sabermos se estamos felizes na nossa vida ou não. E quando não, fazer uma análise minuciosa de todas as escolas que temos, e quais os problemas que cada uma possua. Vamos supor que você chegue a conclusão, que, uma das piores escolas em que você está envolvido seja o trabalho. Imagine que você está vivendo infeliz porque seu trabalho é desmotivador e desgastante, e tudo o que ainda o faz manter lá é a taxa alta de desemprego e o salário que paga suas contas.

Numa situação como essa, pode parecer difícil sair dessa. Muitos livros de auto-ajuda por aí tentando propor mudanças radicais, do tipo largar tudo e recomeçar. Mas a gente sabe que não é uma coisa simples, que no dia seguinte após refletir sobre isso a gente põe em prática. O tempo trabalha com um algorítimo de mudança que faz com que todos os conselhos e dádivas de auto-ajuda percam um pouquinho do sentido. Então, eu queria propor uma coisa um pouco diferente, mas que para funcionar, o conceito de uma escola vivencial precisa estar bem definido até aqui. Por que eu vou dar um exemplo dentro dessa metáfora para ser usado na sua realidade: seja um aluno bagunceiro.

Em qualquer escola, haverão os alunos aplicados, que geralmente irão prestar mais atenção em todas as aulas e tirar as melhores notas. Toda nossa sociedade é baseada numa espécie de meritocracia, que faz com que ser um aluno aplicado signifique a coisa certa a ser feita. E sim, os professores agradecem essa postura. Mas quando a gente está abstraindo coisas ruins, ser um aluno aplicado apenas o fará abstrair as coisas ruins com mais eficiência - e por tanto piorando ainda mais - a situação atual. Daí que um aluno bagunceiro, justamente por não ter sua atenção tão voltada para as aulas, acaba abstraindo menos informação, e por tanto, se contaminando menos.

Além de tudo isso, é claro que também há um outro contra-ponto bem interessante. Toda sua vida pode ser segmentada em várias escolas vivenciais das quais participa. Você deve ser capaz de conseguir separar quantas horas por dia dedica ao trabalho, aos amigos, família, relacionamentos, espiritualidade, conhecimentos técnicos, cultura, etc.  Dentre todas essas escolas, ser o aluno bagunceiro e desinteressado naquelas que nada acrescentam é algo bom. Mas tem algo que pode ser ainda melhor: matricule-se em novas escolas. É isso aí, vou deixar sua mente trilhar o resto, com o insight que já tive nessas reflexões perdidas por aqui.

Conclusão


Se você já tentou mudar alguma coisa em sua vida e viu que não funcionou, ou apenas ouviu aquele papinho utópico de que basta seguir uma receita de bolo para a vida melhorar, então repense um pouquinho em tudo o que leu. Será que as más escolas em que você está matriculado merecerem realmente de toda sua atenção? E se, você puder se matricular em algum cursinho novo por aí? Talvez uma leitura de um livro sobre determinado assunto todos os dias; talvez um tempo maior para dedicar a reconstrução de um relacionamento; talvez um tempo ouvindo as músicas que gosta ou aprendendo coisas novas num podcast. São muitas possibilidades e muitas reflexões. E tudo isso apenas para que eu pudesse propor um contexto de nossa realidade, dentro de algo mais simples para visualizar.


Essa vai ser a finalização mais breve, pois gostaria de apenas repetir uma frase desse post: Pense em quantas escolas você pode estar nesse momento em que nem faz ideia... Pensou, diz aí nos comentários se concorda com esse devaneio. Qualquer dia eu tentarei fazer outros posts dedicados a outras duas filosofias de vida parecidas com essa, que é a do suporte às mesas e a do terreno baldio. Enquanto isso, se você também quiser compartilhar uma sintetização particular da sua da vida, pode postar também.

Realidade Alternativa: Fome → Você vive bem com o que tem?
Como Copas e Raízes → Um conto metafórico qualquer
Você tem certeza? → Reflexão sobre as dúvidas que temos na vida
Desilusões do Tempo → Minha parcela de falar sobre o efeito do tempo
"O início do pensamento está no desacordo. Não só com os outros, mas consigo mesmo" (não lembro de onde ouvi ou li essa citação! alguém me ajuda para por os devidos créditos?)